quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Os Quatro Elementos - João Cabral de Melo Neto


AR

Um pássaro
Um avião
Um bailarino
Estão perdidos
No ar que eu respiro.

Uma casa
Uma árvore
Uma cidade
Se agitam
No ar que me banha.

No ar ás vezes perturbado
Pela rápida passagem
Da poesia :

Numa flor que treme
Num homem que se esquece
Nos noturnos sonhos ainda próximos
Tirando a lucidez
Ao ar da manhã.
TERRA

Á terra não é dado se evadir
(A terra diária : excesso talvez
De mãos necessárias como o ferro)
Como no céu foge uma nuvem
Como no ar erra a presença
Transparente - o mundo luminoso
Que a terra pode apenas ir sonhado.
ÁGUA

Água, água, água;
Água do mar e do copo;
Da sede e do navio;
Distância
Entre mim e o naufrago.

Presença futura na nuvem
Voando sobre Nova York;
No inverno
Molhando nossas almas

Água ausente da lua
Das pedras, dos fantasmas
Que surpreendemos imitando
Nossos gestos aquáticos.

Água sempre pronta
Para fugir, para partir :
(Fuga no ar como os sonhos)
Água do vapor de água.
FOGO

Fogo informe e obscuro
Que as palavras não atingem ;
Fogo um só como o homem
Fogo um só sobre a terra ;

Acaso sempre renovado
Da luz elétrica que se acende
De um sol que sempre nasce
Criando as profundezas
Debaixo do céu e dentro do meu quarto.

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